quarta-feira, abril 25, 2007

25 de Abril


(2004)


Pedra Filosofal

Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

Eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é Cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarela voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida.
Que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.


António Gedeão, 1955


Pela Liberdade.

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4 comentários:

hfm disse...

Bela escolha.

intruso disse...

um dos meus poemas favoritos (de sempre)
...

bj

Luísa R. disse...

Obrigada, Helena.

Luísa R. disse...

Intruso,

Também é um dos meus poemas preferidos.

Espero que faça sempre sentido para mim.
Mesmo quando eu for velhinha, velhinha...

Será que conseguiremos manter o sonho como uma constante na vida?
Mesmo quando a vida nos leva a pensar que não?
Espero que sim.
Senão, nada fará sentido.